terça-feira, 24 de agosto de 2021

CANDYMAN (Clive Barker).

 

NOTA: 9.5



Eu já mencionei algumas vezes aqui que Clive Barker é um dos maiores escritores de horror de todos os tempos. Sua obra mais famosa, Hellraiser, é sem dúvida, um dos trabalhos mais assustadores e originais que já vi. Também ambientado no mesmo universo, o livro Evangelho de Sangue até que é divertido e grotesco, mas não chega aos pés da obra anterior.

 

E hoje, vou falar sobre outra obra do autor, talvez a mais famosa depois de Hellraiser: CANDYMAN, ou O Proibido, como também é conhecido.

 

Bom, esse é um dos melhores textos do autor que já li, e motivos para isso não faltam. Barker conseguiu criar uma história verdadeiramente assustadora, com uma temática apropriada: lendas urbanas. Eu pessoalmente acho o próprio termo assustador, porque sempre passa a impressão de algo macabro que aconteceu nas cidades ao longo dos anos. Bem, aqui temos exatamente isso.

 

Candyman é uma excelente historia sobre o assunto, apesar de não focar totalmente nisso. Na verdade, no início, temos a impressão de que estamos lendo uma história sobre investigação, uma vez que a protagonista, a universitária Helen, decide se aventurar nos bairros decadentes de Liverpool a fim de encontrar mais e mais material para sua tese, no caso, as pichações locais. Somente após a protagonista ouvir relatos sobre homicídios na região, é que a historia muda de foco e passa a se concentrar na lenda urbana do personagem-título, também conhecido “O Proibido”, visto que todos têm medo de falar sobre ele.

 

Esse é o grande ponto da história, na minha opinião. Barker criou uma entidade tão perversa que até os moradores da região têm medo de pronunciar seu nome, e honestamente, isso é o tipo de coisa que me atrai muito em histórias de terror; essa coisa da entidade maldita que traz mau-agouro para todos é uma das melhores representações de algo terrível, e já tivemos grandes exemplos, e este é mais um deles.

 

E sendo uma história de Clive Barker, não poderiam faltar cenas grotescas, e aqui temos ótimas delas. O autor até faz uso de um dos maiores tabus do horror para conduzir as investigações da protagonista e fazê-la adentrar no território da entidade do título – não direi qual é o tabu para não entregar spoilers; digo apenas que o autor não mostra nenhum pudor ao falar dele. E temos também algum conteúdo sexual, principalmente quando Helen encontra a entidade.

 

E falando em Candyman, foi separar um tempo para falar sobre ele. Quem já viu o filme, sabe como ele é fisicamente, mas, ao ler a história original, a coisa é bem diferente. Não espere encontrar o Candyman imortalizado por Tony Todd; ao contrário, temos aqui em ser grotesco e repugnante, mas que consegue ser sedutor e charmoso. Não sei para quem já leu, mas eu o imaginei como um homem mesmo, elegantemente vestido, mas não idêntico ao Candyman de Tony Todd, principalmente por causa da cor de sua pele. Sim, aqui, não temos o forte comentário social presente no filme de Bernard Rose, somente uma história sobre uma lenda urbana.

 

Acredito que essa seja a maior surpresa para quem vai ler a história pela primeira vez, porque a questão racial é tão forte no filme, que parece que também foi tirada do texto original, mas não é esse o caso.

 

Mas nada disso nos impede de criar uma conexão com o filme conforme lemos o livro. Eu mesmo, enquanto lia determinadas cenas, pude visualizar as mesmas presentes no filme, principalmente a cena da pichação que simboliza a entidade, o jantar e o encontro da protagonista com Candyman. Não seria surpresa se eu pudesse até ouvir a trilha sonora do filme.

 

Candyman foi lançado na coletânea Livros de Sangue de Clive Barker, mas a mesma se encontrava fora de catalogo há anos. Foi relançado no Brasil pela editora DarkSide Books em belíssima edição individual, com texto de apoio.

 

Em tempo: resolvi ler o livro para me preparar para o novo filme, que estreia em Agosto de 2021, com produção de Jordan Peele, o mestre da crítica social do cinema de terror atual.

 

Enfim, Candyman é excelente. Uma história de horror com elementos investigativos que prende a atenção do leitor até última pagina. A escrita de Clive Barker é perfeita, e o autor cria uma ambientação capaz de deixar o leitor arrepiado, além de dar vida a uma de suas criaturas mais famosas. Um livro arrepiante. Uma leitura rápida, mas digna de nota. Altamente recomendado.


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quinta-feira, 19 de agosto de 2021

O SEGREDO DO BOSQUE DOS SONHOS (1972). Dir.: Lucio Fulci.

 

NOTA: 9.5



Lucio Fulci foi um dos mestres do terror italiano. Desde que resolveu se aventurar no gênero, tornou-se especialista em produções repletas de sangue e gore. No entanto, antes de se aventurar em produções gore, Fulci se aventurou no Giallo, e nos deu grandes exemplares do gênero, como por exemplo, Premonição (1977), Uma Sobre a Outra (1968), Uma Lagartixa num Corpo de Mulher (1971).

 

O SEGREDO DO BOSQUE DOS SONHOS é outro Giallo do diretor. Lançado em 1972, marca a segunda parceria de Fulci com a atriz brasileira Florinda Bolkan, após a colaboração em Uma Lagartixa. O Bosque dos Sonhos é um dos melhores Gialli de Fulci e também o mais polêmico, o que levou a ser excomungado da igreja católica.

 

Polêmicas à parte, o filme é um dos melhores exemplares do gênero, e um dos meus favoritos. O longa apresenta um dos temas mais pesados do gênero: o assassinato de crianças.

 

Não é segredo para ninguém que a morte de crianças é um dos maiores tabus do cinema, e aqui, Fulci faz uso desse tabu sem o menor pudor, com cenas de assassinatos cruéis. Tudo bem, o número de vítimas do assassino não é muito grande, mas mesmo assim, somos brindados com momentos de tensão que parecem piorar a cada revisão.

 

Aqui como em seus outros Gialli, aqui, Fulci não faz uso do assassino tradicional, com luvas pretas, mas mesmo assim, essa é uma grande variação do gênero. Como eu disse, eu aprecio algumas variações do Giallo, mas ainda prefiro o Giallo clássico. Mas mesmo assim, esse filme consegue ser muito agradável.

 

O principal detalhe é a ambientação. Ao contrário dos demais, O Bosque dos Sonhos é ambientado no interior da Itália, e Fulci soube capturar excelentes tomadas do interior, dando um ar convidativo para o filme. Devo dizer que essa ambientação é um dos meus fatores favoritos sobre o filme, e me passa uma ótima sensação. E além da ambientação de interior, temos também ótimos personagens, que passam a sensação de serem realmente pessoas simples do campo. E em relação a isso, Fulci também não teve o menor pudor em mostrar as pessoas como realmente são, então, temos aqui personagens malcuidados, com as roupas e os rostos sujos de terra e suor; além de figurantes idosos desdentados. Tudo isso aumenta ainda mais o realismo e deixa as cenas de tensão ainda melhores.

 

Sobre isso, digo o seguinte: temos aqui cenas dignas de programas sensacionalistas da TV, com o povo se juntando na porta da delegacia para exigir a captura do assassino, ou para linchá-lo em público. E claro, a coisa fica pior com a chegada de vários repórteres, dispostos a tudo para conseguir uma exclusiva. Em resumo, temos um verdadeiro circo midiático e popular. É possível notar que as pessoas daquele vilarejo querem um culpado a qualquer custo, e estão dispostos até a fazer justiça com as próprias mãos, conforme visto na cena do cemitério. Todos esses detalhes aumentam ainda mais o teor chocante do filme e o deixam ainda mais perturbador.

 

E não para por aí. Além da questão do assassino de crianças, temos também uma forte questão sexual, que fica ainda mais perturbadora porque envolve as crianças, principalmente os meninos. Logo no inicio do filme, Fulci nos presenteia com uma cena de nudez da atriz Barbara Bouchet – uma das musas do gênero – cuja personagem possui um forte apelo sexual e também um ar de mistério, que contribui para torna-la suspeita dos crimes. Patrizia, sua personagem, não demonstra pudor ao tentar seduzir um garoto que trabalha para ela, utilizando palavras de cunho sexual explicito. Realmente, uma cena que não seria realizada nos dias de hoje. Na verdade, eu tenho certeza que o filme não seria realizado nos dias de hoje, principalmente por causa de questões politicamente corretas, devo dizer, há muita coisa errada nesse filme, além dos assassinatos das crianças. Claro, Fulci não as exibe na tela, mas deixa a critério do espectador. Eu mesmo tenho algumas teorias perturbadoras envolvendo o personagem do padre.

 

Como mencionado acima, O Bosque dos Sonhos marcou a segunda colaboração de Fulci com a atriz brasileira Florinda Bolkan. Aqui, ela interpreta a Bruxa do vilarejo, uma mulher que vive sozinha no bosque a pratica feitiços com bonecos de cera. Logo de cara, Fulci faz questão de mostra-la como uma das suspeitas dos crimes, uma vez que ela é vista na cena de um dos crimes. Além disso, ela é mal vista pela população, que tem o habito de cuspir no chão sempre que a vê. E quando a polícia consegue captura-la, a coisa não muda de figura. A população se revolta com toda sua força e se mostra ainda mais hostil. E temos a cena do cemitério, talvez a cena mais cruel e violenta do filme, onde ela é açoitada com correntes, tudo ao som de Ornella Vanoni. A atriz entrega uma ótima atuação aqui.

 

Essa cena e a cena final mostram que Fulci sabia lidar com o gore ainda em seus primeiros filmes de terror, e o diretor não poupa ninguém. A cena do cemitério é a mais violenta do filme todo, graças à atuação e aos efeitos especiais de maquiagem, que lembram a cena de abertura de Terror nas Trevas (1981), que também contou com a presença de correntes.

 

E em certo ponto do filme, Fulci faz questão de mostrar um boneco do Pato Donald, fazendo alusão ao título do filme. E a revelação do assassino, bem como seu motivo para os crimes, são tão pesados que levaram o diretor a ser excomungado pela Igreja Católica; uma prova de que o diretor não tinha o menor medo de mostrar questões pesadas na tela.

 

Bom, seja como for, O Segredo do Bosque dos Sonhos é um dos melhores filmes de Lucio Fulci e um dos melhores exemplares do Giallo.

 

Foi lançado em DVD no Brasil pela Versátil Home Vídeo na coleção Giallo, em versão restaurada com áudio italiano.

 

Enfim, O Segredo do Bosque dos Sonhos é um filme perturbador. Um Giallo com clima de interior que enche a tela. A direção de Lucio Fulci é um dos destaques, e o diretor consegue criar cenas de tensão que deixam o espectador nervoso, além de focar em assuntos proibidos sem o menor pudor. Uma história pesada, cheia de momentos revoltantes, e de suspense. Um filme excelente. Altamente recomendado.


Créditos: Versátil Home Vídeo

 

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