sexta-feira, 22 de setembro de 2023

A SOMBRA VINDA DO TEMPO (H.P. Lovecraft).

 

NOTA: 8.5


O escritor H.P. Lovecraft é um dos maiores autores de horror e ficção cientifica de todos os tempos, graças às suas histórias focadas no chamado horror cósmico, e nos Mitos de Cthulhu, que se tornaram um marco em sua bibliografia.

 

A SOMBRA VINDA DO TEMPO, novela escrita pelo autor e publicada em 1936, parece fazer parte dos Mitos de Cthulhu, mas não tenho certeza porque, de acordo com cada fonte, as historias presentes nesse universo são diferentes.

 

Mesmo não tendo certeza se faz parte dos Mitos, A Sombra faz parte da fase do Terror Cósmico, que se tornou muito famoso na bibliografia do autor. Mas o que é o Terror Cósmico?

 

Bem, eu pessoalmente acho um pouco difícil de definir, visto que existem diversas definições e exemplos visuais, mas ao que parece, o conceito surgiu nas obras de Lovecraft.

 

A história é sobre um professor da Universidade Miskatonic, também presente nas obras do autor, que sofreu um período de anos de amnesia, enquanto sua mente era possuída por criaturas de outra dimensão, conhecidos aqui como a Grande Raça. Parece um resumo bem simples, não? Bem, na verdade é um pouco mais complexo que isso, porque a trama também aborda questões de viagem no tempo e no espaço.

 

Eu pessoalmente gostei bastante dessa historia, pois tenho curiosidade de saber sobre o que se trata o Terror Cósmico de Lovecraft, e com essa leitura, tive uma amostra.

 

O texto do autor – descrito em primeira pessoa, como de costume – é muito bem escrito, e Lovecraft faz uso de descrições detalhadas para dar vida às suas criaturas e ambientes, principalmente os membros da Grande Raça, aqui descritos como uma espécie de vida capaz de viajar no tempo e espaço através da possessão de corpos.

 

Mas não estamos falando de possessão no sentido normal da palavra, visto que as criaturas se apossam do corpo e da mente do protagonista, e o fazem sofrer de amnesia e ter visões horríveis, durante muito tempo, o que culmina no fim do seu casamento e da relação com dois de seus três filhos.

 

Mas vamos falar das criaturas e do lugar de onde elas vêm. Novamente, tudo está na descrição de Lovecraft, principalmente das criaturas, que foge completamente do padrão. O autor os descreve como seres alienígenas em forma de cone, com tentáculos e tenazes e três olhos. Eu já havia ouvido falar que as criaturas de Lovecraft são incapazes de serem reproduzidas visualmente, mas aqui confesso que precisei de um pouco de ajuda, pois não tinha certeza de qual seria sua aparência. E pelo que vi, as criaturas são de fato assustadoras.

 

A respeito do lugar de onde vêm, Lovecraft o descreve como um deserto composto por altas torres escuras, além de bibliotecas, remetendo, talvez, à sua fase conhecida como Ciclo dos Sonhos, onde suas tramas eram ambientadas nos desertos da Arábia. Mesmo não tendo lido nenhuma historia dessa fase, foi essa a impressão que eu tive.

 

O personagem principal também é muito bem escrito. Lovecraft o descreve como um professor da renomada Universidade Miskatonic, especializado em Política Econômica. Segundo informações da internet, existem laços autobiográficos no personagem, principalmente no que diz respeito à sua amnesia, que se assemelha ao colapso nervoso que o autor sofreu em sua juventude. Se é verdade ou não, não sei.

 

O fato é que é possível simpatizar com esse personagem, e conforme a leitura avança, vemos que ele é genuinamente preocupado com o que lhe aconteceu, além de ser determinado em encontrar a origem das criaturas que o assombram, algo que acontece durante uma expedição ao deserto da Austrália. Quando li que ele estava retornando de uma expedição, eu rapidamente fiz uma associação com Nas Montanhas da Loucura, a grande obra-prima do autor.

 

Aliás, falando em Nas Montanhas da Loucura, devo destacar que, mais uma vez, Lovecraft cria uma espécie de multiverso, onde todas suas historias estão conectadas. Isso porque temos menção às criaturas de Nas Montanhas; à terrível cidade de Arkham; e ao terrível Necronomicon. Lovecraft já fez isso em outras de suas obras, e é sempre um prazer ler sobre essas ligações e esse multiverso.

 

E no final, Lovecraft entrega algo que parece ter sido de um filme de Indiana Jones, onde o nosso protagonista se aventura pelas ruinas de uma das torres das cidades da Grande Raça, e encontra um livro que pode conter a resposta para tudo. Contudo, as coisas não saem como planejado, e a conclusão da novela é de cair o queixo.

 

Então temos aqui mais um exemplo da maestria de Lovecraft em contar histórias, visto que o autor faz tudo com seu estilo clássico de descrever demais, tanto as coisas quanto as sensações, e confesso que é um pouco cansativo de ser ler, mas, acredito que se você fizer um esforço, pode acabar gostando, como foi o meu caso.

 

Enfim, A Sombra Vinda do Tempo é uma história muito boa. Uma trama de ficção cientifica, misturada com horror cósmico, contada com a maestria singular de H.P. Lovecraft, do jeito que somente o autor sabia fazer. Em suas paginas, o autor leva tanto o protagonista quanto o leitor, a um mundo cósmico, habitado por criaturas de outra dimensão e com isso, ficamos imersos na leitura, tentando descobrir se o que aconteceu foi real ou não. Uma ótima novela, e um dos melhores textos de Lovecraft. Altamente recomendado. 


H.P. LOVECRAFT


segunda-feira, 18 de setembro de 2023

A NOITE DAS BRUXAS (2023). Dir.: Kenneth Branagh.

 

NOTA: 9.5


Desde que se aventurou a adaptar as obras de Agatha Christie, com o excelente Assassinato no Expresso do Oriente, lançado em 2017, o ator e cineasta Kenneth Branagh tem acertado na mosca. Os filmes são muito bem feitos, principalmente os roteiros, que deixam o espectador envolvido e ansioso para desvendar o mistério.

 

Foi assim com Expresso, foi assim com Morte no Nilo, lançado no ano passado, e é assim também com A NOITE DAS BRUXAS, terceira incursão do cineasta no chamado “Agathaverso”, novamente dirigindo e interpretando o clássico detetive Hercule Poirot.

 

E que filme!

 

Um aviso. Acabei de sair do cinema, então, tentarei conter os spoilers. Então vamos lá.

 

Temos aqui mais um acerto na mosca do cineasta, que soube adaptar a obra da escritora com maestria, desta vez, segundo consta, tomando liberdades criativas. Como ainda não li o livro, não posso dizer que liberdades criativas foram essas, mas digo que ambientar a historia em Veneza foi um grande acerto, porque criou um clima de mistério – e por que não, terror – ainda maior para a trama, além de acender minha memoria – mais detalhes adiante.

 

Mais uma vez, eu saí muito satisfeito do cinema, e desde já, peço por mais filmes ambientados nesse universo!

 

A Noite das Bruxas é excelente. É muito bem feito, bem dirigido, com ótimo design de produção, e como de praxe, um elenco estelar. O diretor Branagh fez mais uma vez um grande trabalho aqui, tanto atuando, quanto dirigindo. Mesmo não tendo assistido a todos os seus filmes, eu sei o grande cineasta que ele é, principalmente quando resolve se aventurar no universo de Shakespeare, por exemplo. Mas devo dizer que ele também encontrou seu lugar no “Agathaverso”, e espero que continue assim.

 

Como de costume, temos aqui uma história de mistério, contada com a maestria que a autora sabia empregar em suas obras – só digo isso com base na leitura do livro que originou o primeiro filme desse universo, que vai ganhar releitura e resenha aqui. No entanto, ao contrario das demais, aqui temos também uma leve história de terror, com fantasmas e lugares amaldiçoados. Novamente, não sei como é no livro original, mas devo dizer que achei a ideia de um palazzo assombrado genial, quase igual aos filmes de terror gótico realizados na Itália nos anos 60.

 

Eu gostei bastante da ambientação e do cenário. Parecia mesmo uma casa assombrada há séculos, do tipo que ganham fama com o boca-a-boca. E claro, o fato de ambientar a historia no Dia das Bruxas foi outro acerto, porque deu voz àquela velha regra, a de que as assombrações são mais fortes na Noite das Bruxas.

 

E como é um filme de Dia das Bruxas – sim, é um filme de Dia das Bruxas! – temos tudo que se espera de um filme como esse. Isso porque a história começa com uma festa de Dia das Bruxas, dada pela dona do palazzo, a Srta. Rowena Drake. No entanto, a festa é apenas um disfarce para uma sessão espirita, que terá como convidada, a médium Joyce Reynolds, que está ali com o pretexto de entrar em contato com a filha da Srta. Drake, que morreu misteriosamente anos antes. Mas pode esperar por mais, principalmente um mistério de assassinato – obviamente, não direi quem morreu e quem matou – que obriga Poirot a sair da aposentadoria.

 

E vou parar por aqui, pois não vou entregar detalhes da trama. O filme acabou de estrear no cinema, então, corra para a sala mais próxima e confira por si mesmo.

 

Como já mencionei, o filme possui alguns elementos de terror, e isso se deve principalmente à ideia de um lugar assombrado por fantasmas, o que culmina em algumas aparições durante a projeção, e jump-scares espertos. Sim, temos jump-scares, mas eles são muito diferentes dos usados no cinema atualmente. E a presença de figuras vestidas de preto, usando as famosas máscaras também contribui para deixar o filme mais assustador.

 

Além disso, é um filme que se passa todo durante a noite, uma noite chuvosa, que obriga os personagens a ficarem trancados no palazzo, reaproveitando uma técnica narrativa utilizada no primeiro filme – os personagens ficam presos por causa de um evento natural, no caso, uma tempestade. E tal fato contribui para deixar a trama ainda mais claustrofóbica, com Poirot interrogando os suspeitos, um por um, de diferentes métodos, até que um ou mais acabem agindo de forma suspeita e quase revelando demais. E claro, a lista de suspeitos é enorme.

 

O elenco também é um grande destaque, novamente composto por grandes astros do cinema, como de costume. Todos os atores estão muito bem aqui, e não passam a sensação de atuação forçada ou caricata; eles realmente passam tudo o que os personagens devem passar, conforme está escrito, tanto no livro, quanto no roteiro. E é sempre bom ver atores de outros gêneros em papéis fora de sua zona de conforto.

 

E antes de encerrar, conforme mencionei acima, o filme despertou minha memoria por causa de sua ambientação em Veneza. Durante toda a projeção, eu tive a impressão de estar assistindo a um Giallo, principalmente Quem a Viu Morrer? (1971), do diretor Aldo Lado; ou então, ao filme Inverno de Sangue em Veneza (1973). Tal sensação foi muito boa, e despertou em mim a vontade de assistir a esses filmes novamente.

 

E que venham mais filmes do “Agathaverso”!

 

Enfim, A Noite das Bruxas é um filme excelente. Uma historia de mistério e horror contada com a maestria do cineasta Kenneth Branagh, que brilha novamente no papel do detetive Poirot. A ambientação em Veneza também é um atrativo, em especial o cenário principal, que passa uma sensação de medo, misturada com desconforto e claustrofobia. E o elenco também não faz feio, com seus nomes de peso, como é costume nas adaptações da autora Agatha Christie. Um filme excelente e assustador. Altamente recomendado.



quarta-feira, 6 de setembro de 2023

CORAÇÃO ASSOMBRADO – STEPHEN KING – A BIOGRAFIA (Lisa Rogak).

 

NOTA: 8.5


Eu já disse – e vou continuar dizendo – que Stephen King é um dos maiores escritores de todos os tempos, com uma capacidade ímpar de contar histórias. E como vocês sabem, eu já resenhei algumas de suas histórias aqui.

 

E hoje, vou falar novamente sobre Stephen King, mas não sobre suas histórias, e sim, sobre CORAÇÃO ASSOMBRADO, da autora Lisa Rogak. Mas o que esse livro tem a ver com Stephen King? Bem, tudo, porque se trata da biografia, ainda que não autorizada, do mesmo.

 

A autora faz um ótimo trabalho ao contar a história de vida do autor mais famoso do Maine, passando por sua infância pobre, chegando à juventude, até o sucesso como escritor.

 

Aqui, ela faz um relato quase que detalhado da vida de King, e conta tudo com maestria digna de nota.

 

Primeiro ela começa a falar sobre o passado da família de King, mais precisamente o de sua mãe, Ruth, que teve de criar os filhos sozinha, uma vez que o pai de King saiu de casa quando o autor tinha apenas dois anos, conforme ele mesmo conta diversas vezes. Rogak conta a respeito das dificuldades de Ruth em arranjar comida para os filhos, e às vezes, sobre como eles não tinham nem o que comer para que King pudesse estudar.

 

Além da pobreza de família, Rogak também nos conta como Stephen King descobriu o gosto pela literatura, através dos gibis da EC Comics – Tales from the Crypt, principalmente, e de obras de diversos autores. A autora relata que o jovem King vivia sempre acompanhado de um livro e que gastava horas do dia lendo e devorando as páginas.

 

Temos também o relato de quando King começou a escrever, quando ainda estava na escola, e teve, por exemplo, de escrever uma versão própria do conto O Poço e o Pendulo, clássico de Edgar Allan Poe, que ele vendia pelos corredores da escola. Além disso, temos também os relatos de King na faculdade, onde continuou a escrever suas histórias, além de trabalhar no jornal da escola, e de criar o seu próprio, onde publicava notícias do campus.

 

Rogak também faz um apanhado das encrencas em que King se meteu na época de faculdade, quando foi preso por conta de bebida, e sobre como conheceu sua esposa, Tabitha Spruce, com quem é casado até hoje. E mais para frente, temos os primeiros contos publicados do autor, que eram lançados em revistas masculinas, e rendiam bons cheques a ele, mas nem todos eram suficientes para pagar as contas.

 

King passou um bom tempo com dificuldades financeiras, tendo de trabalhar como professor para poder pagar as contas, mas ele mesmo acabava gastando o dinheiro com bebida, o que gerava problemas para a família.

 

Mas como sabemos, tudo isso mudou em 1973, quando King enviou para a editora Doubleday o original do que seria o seu primeiro romance, o clássico Carrie – A Estranha. A autora revela que King não tinha muita fé no manuscrito, visto que seus manuscritos anteriores haviam sido rejeitados pela mesma editora. Porém, contrariando suas expectativas, Carrie foi vendido e se tornou um sucesso absoluto, assim como seu segundo livro, ‘Salem’s Lot.

 

Nos capítulos seguintes, a autora nos conta mais detalhes sobre a vida do autor, destacando como King criou seu pseudônimo, Richard Bachman, e sobre os livros que escreveu sob esse pseudônimo, entre eles, o polêmico Fúria, que foi banido pelo próprio autor após o massacre de Columbine, em 1999. Rogak nos revela que King escreveu alguns dos livros de Bachman ainda antes de escrever Carrie, e que, após o sucesso do mesmo, os livros foram publicados.

 

Rogak também nos revela também o período em King foi viciado em drogas, principalmente cocaína, que o consumiu por anos. Foi nessa época que o autor começou a escrever compulsivamente, chegando a lançar três livros em um curto espaço de tempo, dentre eles, A Incendiaria, A Zona Morta e Cujo, que, como o próprio King relata, não se lembra de ter escrito devido ao vício.

 

Além disso, somos também apresentados ao lado cinematográfico do autor, com sua passagem pelo cinema, graças ao sucesso das primeiras adaptações de seus livros e contos, dentre eles, claro, O Iluminado, dirigido por Stanley Kubrick, que desagradou King. Rogak nos conta por exemplo, como foi a criação de Creepshow, além das recepções – por parte do próprio King – às versões para cinema produzidas até então.

 

Nessa mesma época, King enfrentou desavenças com sua principal editora, a Doubleday, que publicou muitos de seus grandes sucessos, e foi obrigado a mudar para outras editoras, mas mesmo assim, enfrentou problemas, porque a Doubleday não queria lhe dar o dinheiro que achava que precisava. Ao invés disso, o autor firmou um acordo e publicou O Cemitério em 1983, livro que ele odiava e não queria ver publicado.

 

Além disso, a autora também nos conta como foi a relação de King com as drogas, e sua luta para se manter sóbrio durante a década de 90. Também ficamos sabendo da relação do autor com seus fãs, destacando dois episódios envolvendo fãs malucos, que invadiram a casa dos King e os ameaçaram com bombas.

 

Temos também um relato de como King montou sua banda, e as apresentações que fizeram ao redor dos Estados Unidos ao longo dos anos. A autora também faz um apanhado de como os filhos do autor resolveram se aventurar na arte do pai, e acidente que Naomi sofreu.

 

E para finalizar os eventos importantes na vida do autor, o livro também descreve como foi o atropelamento que ele sofreu em Junho de 1999, que quase lhe custou a vida. Rogak nos conta o que King estava fazendo antes de ser atropelado, bem como foi a sua vida após o acidente, e sua luta para se livrar de um novo vicio, desta vez de analgésicos.

 

E claro, temos diversas menções à aposentadoria de King, algo que ele sempre diz que vai se concretizar, mas nunca fez, visto que em Setembro, teremos o lançamento de Holly, seu livro mais recente.

 

Não entrarei em mais detalhes para não dar spoilers – até porque eu já falei de muita coisa aqui.

 

No geral, eu achei o livro muito bem escrito e até um pouco bem humorado – não sei se teve alguma coisa a ver com a tradução, mas foi essa a impressão que tive.

 

Além de ser uma biografia, também pode ser encarado como uma espécie de manual para quem quer escrever – digo isso porque, conforme eu lia, me senti com mais vontade de retomar minhas escritas, principalmente os livros que estão empacados.

 

A autora fez um ótimo trabalho de pesquisa, mas eu senti um pouco de falta de mais informações sobre o passado da família do autor, uma pesquisa um pouco mais aprofundada, mas isso não atrapalhou a leitura.

 

A escrita do livro também é muito boa, e às vezes, parece que a autora está conversando conosco, vide o modo como ela usou as palavras. Eu confesso que me diverti com algumas passagens, apesar de ter encontrado dificuldades em outras – deve ter sido por causa do meu modo e ritmo de leitura.

 

Mas no geral, eu gostei bastante de Coração Assombrado, e recomendo a leitura para quem gosta de biografias, e principalmente, de Stephen King.

 

Enfim, Coração Assombrado é um livro muito bom. Uma leitura rápida e às vezes divertida, que prende a atenção do leitor e o deixa curioso para saber o que mais aconteceu na vida do Mestre Stephen King. A autora fez um ótimo trabalho e nos apresentou os grandes momentos da vida do autor com sensibilidade e até bom humor. Um livro recomendado para quem gosta de biografias, e principalmente, gosta de Stephen King. 


segunda-feira, 4 de setembro de 2023

INTERNATO DERRADEIRO (1969). Dir.: Narciso Ibañez Serrador.

 

NOTA: 9


Em 1975, o diretor espanhol Narciso Ibañez Serrador lançou Os Meninos, um dos filmes mais perturbadores e assustadores que eu já vi, que foi resenhado aqui.

 

Porém, anos antes, Serrador já havia se aventurado no terror com INTERNATO DERRADEIRO, que é o alvo dessa resenha.

 

Bom, eu vou ser sincero aqui, e dizer que este é um dos melhores filmes de terror que já vi. É um daqueles casos onde tudo contribui para deixar um filme bom.

 

Mas não se engane, este não é um filme perturbador no nível de Os Meninos, apesar de tocar em assuntos um tanto controversos também. Se puder resumir, eu diria que é um daqueles filmes que se passam em um internato onde coisas misteriosas acontecem, e só.

 

E é isso mesmo que acontece aqui, embora não possa dizer em quantos graus se difere de outros filmes com essa pegada, porque eu não vi esses outros filmes; o mais próximo disso é o Clássico absoluto de Dario Argento, Suspiria (1977), que também aborda essa questão de um colégio interno para garotas, mas com uma temática sobrenatural; e outro exemplo é o também excelente Até o Vento tem Medo (1968), do mexicano Carlos Enrique Taboada, e um dos meus filmes de terror favoritos.

 

Pois bem, aqui, nós temos uma historia de horror ambientada em um internato para garotas, mas, diferente dos mencionados acima, a pegada de horror não é voltada para o sobrenatural – mais detalhes adiante.

 

Vamos falar então do filme como um todo. Conforme já mencionei em outras resenhas, o que faz deste um filme tão bom é a técnica. O diretor Serrador é absolutamente competente naquilo que faz, e se mostra um grande diretor, fazendo uso de movimentos de câmera pelos cenários, além de arrancar ótimas performances de seu elenco.

 

O roteiro também é muito bom, porque, como já disse, aposta no terror, mas no terror psicológico, e as vezes, demora para entregar o gênero, apostando no drama e no suspense, a fim de criar tensão e medo no espectador. Mas não se engane, nós temos cenas verdadeiramente tensas, como por exemplo, a cena do banho das garotas, onde o filho da proprietária do internato fica preso na sala da caldeira; ou então a cena da punição, que me serviu de inspiração, devo confessar. E temos outras também, mas não quero entregar spoilers.

 

O elenco – em sua maioria feminino – também merece menção, e todas as atrizes estão muito bem em seus papeis, principalmente a atriz Mary Maude, que interpreta a escudeira da proprietária do internato, Irene. A personagem é perversa em todos os sentidos e não poupa esforços para fazer da vida da mocinha um verdadeiro inferno, com direito a uma cena de humilhação publica – na minha opinião, a pior do filme.

 

Mas não se engane. A atriz Lilli Palmer também não fica atrás, e entrega uma das atuações mais poderosas que já vi em um filme. Sua Madame Fourmeau é controladora, está sempre de olho nas internas e também em seu filho Louis, a quem protege com todas as forças, o que traz consequências desastrosas.

 

O longa foi rodado na Espanha, e o diretor soube aproveitar muito bem o cenário, principalmente o internato. Durante a projeção, é possível perceber que o local quase se torna um personagem do filme e as sensações de claustrofobia e insegurança se fazem presentes. Eu particularmente adoro os takes com a fachada do internato, e devo dizer que o longa como um todo também me serviu de inspiração.

 

Além de ser um filme de terror psicológico, Internato também é um filme sobre repressão. Durante o filme, é possível ver que as garotas são reprimidas, principalmente sexualmente, sendo obrigadas a sair às escondidas para realizar suas fantasias, seja com o filho do lenhador, seja entre elas mesmas, principalmente Irene e Madame Fourmeau, que escondem das demais seus desejos secretos – não uma pela outra, mas pelas outras internas.

 

E claro, temos o elemento do mistério, aqui representado pelo fato de algumas garotas desaparecerem misteriosamente sem deixar rastros. Sem entregar spoilers aqui, mas ao longo do filme, nós vamos descobrindo que elas estão sendo assassinadas por um intruso – ou por alguém de dentro – e quando finalmente descobrimos sua identidade, a revelação e os métodos para os assassinatos são chocantes. Mas como eu disse, sem spoilers.

 

Foi lançado em DVD pela Versátil Home Vídeo na coleção Obras-Primas do Terror 6, em versão sem cortes com áudio em inglês. A versão disponível aqui é a versão integral, no entanto, as cenas cortadas não foram restauradas, mas não atrapalham a experiência.

 

Enfim, Internato Derradeiro é um filme excelente. Um filme de horror psicológico com toques de terror gótico, dirigido por maestria. Um longa cheio de mistérios, que passa tanto a sensação de claustrofobia, quanto a sensação de insegurança. O principal cenário do filme quase se torna um personagem e passa tudo aquilo que precisa passar para o espectador. Uma trama de assassinato e mistério que prende a atenção do espectador até seu final chocante. Altamente recomendado.


Créditos: Versátil Home Vídeo.

 

O MASSACRE DA SERRA ELÉTRICA – O RETORNO (1995). Dir.: Kim Henkel.

  NOTA: 1 Lembram-se do que eu disse no começo da resenha de A Hora do Pesadelo 6 , sobre filmes ruins? Para quem não se lembra, eu disse qu...