NOTA: 10
O PÁSSARO DAS PLUMAS DE CRISTAL (1970) |
Segundo o próprio Dario Argento, o Giallo é um gênero italiano. Surgiu
no país na literatura, com uma pequena editora que lançava os livros de
suspense com as capas amarelas – “giallo” quer dizer “amarelo” em Italiano –
para diferenciá-las dos demais. A partir de 1963, o gênero migrou para o
cinema, graças ao Maestro Mario Bava, que lançou o filme A Garota que Sabia Demais,
que possuía algumas características que se tornariam clássicas no gênero. No ano seguinte,
foi lançado Seis Mulheres para o Assassino, também do maestro Bava, filme responsável
por apresentar as principais características do gênero: as mortes mirabolantes,
a ineficiência da policia, a misoginia, as pistas falsas, e principalmente, o
assassino de luvas pretas. Apesar desse pontapé inicial, não foram muitos os
cineastas que resolveram se aventurar nesse gênero. Até que, em 1970, a coisa
mudou.
Além de ser o primeiro filme do diretor Dario Argento, O PÁSSARO DAS PLUMAS DE CRISTAL, foi também
o filme responsável por lançar de vez o Giallo no cinema. E já em sua estreia, Argento
mostrou a que veio.
A história é contada de forma brilhante, com ótima direção, roteiro
bem amarrado e ótimas atuações. É o tipo de filme onde tudo funciona a seu favor,
e a cada revisão, parece ficar melhor; pelo menos para mim é assim. E mesmo
tendo visto várias vezes, é um filme que gosto muito de assistir.
Não sei ao certo quando meu interesse pela obra de Argento começou,
mas, desde que resolvi me aventurar em sua filmografia – a melhor parte, pelo
menos – me tornei fã e admirador do cineasta, fazendo de seus filmes, uma inspiração.
E este aqui é um dos meus favoritos.
Conforme já mencionei, O
Pássaro é um filme onde tudo funciona, a começar pelo roteiro. Conforme Argento comentou
em entrevistas, ele tinha interesse em modificar as regras do suspense. O que
de fato, ele conseguiu. O roteiro é muito bem escrito, e consegue levar o
protagonista, o escritor Sam Dalmas, a uma teia cheia de enigmas, que parecem
aumentar à medida que ele resolve investigar por conta própria. Esta é também outra
característica do gênero: a investigação que o protagonista faz por conta própria
– quase sempre motivado por algo que testemunhou anteriormente – uma vez que a
policia não consegue resolver os crimes. O fato da policia não conseguir
resolvê-los, já fora estabelecido por Bava, mas, antes deste aqui, não me
lembro de outro exemplar onde o protagonista resolve investigar o mistério; talvez
nos filmes que vieram depois de Bava, mas não posso afirmar com certeza
absoluta. O fato é que aqui, Dalmas faz exatamente isso, uma vez que o Comissário
Morossini e seus homens estão em um beco sem saída.
Já no primeiro filme, Argento apresentou uma de suas principais características:
o uso de câmeras subjetivas. É incrível o que a câmera faz em determinadas
cenas, principalmente simula os POV’s – pontos de vista. E um cena em especial,
Argento e o diretor de fotografia, Vittorio Storano, posicionam a câmera sobre
um lance de escadas de um prédio, dando uma ótima perspectiva do ambiente. Outra
que o diretor soube fazer muito bem foi enquadrar as mulheres. Segundo o próprio
Argento, essa habilidade surgiu ao seu costume de observar o trabalho da mãe, a
fotógrafa brasileira Elda Luxardo, que passava horas fotografando atores e
atrizes italianos famosos. E dá para perceber que o diretor aprendeu muito bem.
Os enquadramentos são perfeitos, principalmente das mulheres. Acho que nunca vi
um filme em que as atrizes foram tão bem enquadradas pela câmera, algo que o
cineasta utilizou em seus filmes futuros.
Outra coisa que funciona muito bem é a trilha sonora, composta pelo Maestro
Ennio Morricone. Ao invés de uma trilha pesada, Morricone utilizou vozes
femininas para fazer um coro parecido com uma canção infantil. É uma trilha que
combina muito bem com a atmosfera.
Mas talvez as melhores coisas do filme sejam as cenas de assassinato,
e o próprio assassino. Como já havia dito no começo, um dos atributos que
tornaram o Giallo conhecido, foi a figura do assassino em roupas escuras,
usando luvas de couro pretas, e aqui temos isso na melhor forma. O assassino
encaixa-se perfeitamente na descrição clássica: usa roupas pretas, jaqueta com
a gola levantada para esconder o rosto, chapéu, e claro, as luvas de couro
pretas. Não tem nada melhor do que isso. Apesar de gostar das variações do gênero,
eu sou fã do Giallo que tenha o assassino com luvas.
Agora, sobre os assassinatos. Se em Seis Mulheres para o Assassino,
Mario Bava conseguiu transformar cenas de assassinato em obras de arte, aqui, Argento
faz a mesma coisa. Apesar de o assassino ter matado cinco mulheres durante o
filme, Argento só mostra duas delas sendo assassinadas, e ambas as cenas são muito
bem feitas, construídas da maneira mais simples, mas com clima de suspense que
deixa tudo mais tenso, deixando o espectador roendo as unhas. E quando os
assassinatos acontecem, são fantásticos desse ver; não que o homicídio seja uma
coisa bonita; eu me refiro ao modo como as cenas são filmadas. Não espere um
banho de sangue. O sangue é espirrado na tela na quantidade certa e do jeito
certo. A melhor cena de assassinato é a segunda, com uma navalha enorme fazendo
seu trabalho; uma cena quase claustrofóbica. Argento levaria essa técnica de
transformar cenas de assassinato em obras de arte para seus filmes futuros.
Uma das coisas pela qual Argento é questionado são as atuações do seu
elenco. Há quem diga os aspectos técnicos do filme são melhores que as
atuações, mas eu não vejo problema. As atuações são muito boas, principalmente
dos quatro personagens principais. Outro “ponto negativo” é o fato de o
protagonista não conseguir identificar o som do pássaro do título – o Grou coroado
oriental – já que ele também estuda aves raras. Minha explicação é que, no
calor da investigação, ele não se lembrou da espécie, ou então, não chegou a ler
sobre ela. Essa é a minha interpretação.
O Pássaro das Plumas de Cristal
foi lançado em Fevereiro de 1970 na Itália, e foi um sucesso de bilheteria;
nos Estados Unidos, ficou em primeiro lugar por três semanas, tornando-se um
sucesso por lá também.
O sucesso do filme foi responsável da introdução do Giallo no cinema,
levando vários cineastas a produzir seus próprios filmes do gênero, muitos
deles com nomes de animais nos títulos.
O filme é o primeiro da chamada “Trilogia dos Bichos”, composta também
pelos filmes O Gato de Nove Caudas e Quatro Moscas Sobre Veludo Cinza,
ambos lançados em 1971, também escritos e dirigidos por Dario Argento.
Foi lançado em DVD no Brasil pela Versátil Home Vídeo, em versão restaurada,
com áudio italiano, na coleção A Arte de
Dario Argento, juntamente com os outros filmes da “Trilogia dos Bichos”, e Terror
na Ópera (1987), um de seus últimos grandes trabalhos.
Enfim, O Pássaro das Plumas de Cristal
é um dos maiores exemplares do Giallo italiano. Um filme com atmosfera de
suspense muito bem construída, que deixa o espectador arrepiado. A direção experiente
de Dario Argento contribui para o ótimo desempenho do filme, além de mostrar o quão
habilidoso ele se tornaria. O filme responsável por catapultar o Giallo no
cinema, além de ter influenciado uma serie de cineastas a seguir o mesmo
caminho. Um filme excelente, que merece ser visto e apreciado. Maravilhoso. Altamente
recomendado.
Créditos: Versátil Home Vídeo |
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