NOTA: 9.5
CHRISTINE, O CARRO ASSASSINO (1983) |
O encontro entre Stephen King e John Carpenter. Assim pode ser
definido CHRISTINE, O CARRO ASSASSINO
(1983), oitavo filme dirigido por Carpenter, baseado no livro de King,
lançado naquele mesmo ano.
Posso dizer, com toda certeza, que é uma das melhores adaptações de
Stephen King, e, também, um dos melhores filmes de John Carpenter. Tudo começou
quando o próprio Stephen King enviou para Richard Kobritz – que havia produzido
Os Vampiros de Salem (1979), baseado
no livro Salem, do mesmo autor – o
manuscrito de Christine, provavelmente com a intenção de transformá-lo em
filme. Kobritz adorou o texto e entrou em contato com a Polar Film, e informou
que tinha intenção de adaptá-lo, com John Carpenter na direção. O resultado foi
um filme excelente.
Desde o primeiro momento, Christine
mostra-se um filme de suspense bem construído, e essa atmosfera não vai
mudando conforme a fita avança. Carpenter deu um ar nostálgico ao filme, o que,
na minha opinião, faz dele ainda mais atraente. A cena no colégio é uma das
melhores, e toda vez que assisto, tenho uma sensação de nostalgia, como se já
estivesse naquele lugar antes – sensação essa que gosto muito, e que não existe
nos filmes de hoje.
O momento seguinte, quando Arnie encontra Christine na casa de George
LeBay – no livro, é seu irmão, Roland, quem vende o carro para o garoto –
também é muito bom, principalmente por causa da fotografia, em tons laranja,
que passam a impressão de sujeira e fim de tarde; as atuações também merecem
destaque, em especial, Keith Gordon e Roberts Blossom, nos papéis de Arnie e
LeBay, respectivamente. Gordon literalmente transformou-se em Arnie, com o ar
de aluno nerd e perdedor presente no livro; já Blossom passa um ar ameaçador
com seu personagem, o que contribui para o clima de mistério e suspense.
O restante da narrativa transcorre com o clima de suspense enchendo a
tela, principalmente nas cenas envolvendo a personagem-título, já completamente
restaurada por Arnie. Christine brilha no filme todo, com sua tintura vermelha,
que pulsa na tela e enche os olhos, chegando a ofuscar o elenco.
Aliás, assim como no livro, aqui, Christine passa a sensação de ser
realmente um objeto inanimado que possui vida própria: é uma garota ciumenta,
possessiva e vingativa, que não mede esforços, nem consequências, para ter o
amor de Arnie e afastá-lo de sua família, seu melhor amigo, Dennis, e seus
desafetos. As cenas em que ela se vinga dos valentões do colégio – e outros
desafetos – são as melhores e mais assustadores, principalmente a primeira,
quando o personagem Moochie Welch é perseguido por ela pelas ruas escuras da
cidade até encontrar seu destino – mostrado de forma diferente no livro. O
mesmo refere-se à sequencia em que Buddy Repperton e seus amigos são mortos por
ela. Carpenter faz tudo de uma maneira sutil, aos poucos, até chegar à tão
esperada conclusão. Aliás, a cena no posto de gasolina é pura de um filme de
Carpenter: após Christine sair atrás de Buddy, envolta em chamas, o local
explode diversas vezes, com as chamas e a fumaça subindo aos céus em bolas
gigantescas.
E falando nos efeitos especiais, eles também não ficam atrás. Para as
cenas em que Christine persegue os desafetos de Arnie pelas ruas, Carpenter
utilizou um modelo com os vidros escuros, para dar a impressão de que ela está
de fato, viva. Afirmo, com toda certeza, que esse truque funciona, e muito bem,
e foi muito melhor do que se eles mostrassem um carro andando sozinho,
controlado por controle remoto ou algo assim – ou talvez, porque não havia
outro jeito de realizar tais cenas; o que importa é que não parece falso de
jeito nenhum.
Como em todos os seus filmes, Carpenter foi o responsável também pela
trilha sonora, aqui em parceria com Alan Howarth, seu colega desde Halloween
II (1981). Contando basicamente com um piano, os dois criaram uma das
melhores trilhas sonoras de um filme do diretor, que casou perfeitamente com o
clima do filme. Anos depois, Howarth ficaria responsável pelas composições das
continuações de Halloween.
Recentemente, Carpenter apresentou a trilha do filme para seu especial Carpenter Anthology, que, como o nome
revela, é uma coleção dos temas dos filmes do diretor, compostas por ele mesmo.
A trilha sonora de Christine é uma
das melhores dos filmes de Carpenter, ao lado do tema de O Enigma do Outro Mundo (1982),
composta por Ennio Morricone, e o tema de Halloween (1978) e À
Beira da Loucura (1994).
Sinceramente, não consigo ver ninguém melhor para dirigir o filme do que
John Carpenter. O filme tem a cara do diretor, seja pela atmosfera ou pelos
outros aspectos já comentados. Carpenter recebeu a proposta para dirigi-lo após
o fracasso de O Enigma de Outro Mundo, lançado no ano anterior. Segundo o
próprio, a Universal Pictures fez um acordo com ele: além desse, o diretor
também ficaria responsável pela adaptação de A Incendiária, outro
livro de Stephen King. Infelizmente, com o fracasso de O Enigma, a Universal
retirou a proposta, o que entristeceu o cineasta e o deixou sem trabalhar por
um bom tempo. Felizmente, o roteiro de Christine
“caiu do céu”, como ele mesmo diz, e Carpenter aceitou dirigir o filme. O
livro A Incendiária foi adaptado para os cinemas em 1984, com Drew
Barrymore como protagonista e Mark Lester na direção. Os fãs de Stephen King
dizem que não é um dos melhores filmes baseados na obra do autor, que concorda
com a opinião deles. Talvez, se Carpenter tivesse dirigido, o resultado seria
diferente... Nunca saberemos.
Como todas as adaptações literárias, o filme apresenta diferenças em
relação ao livro, mas, devo dizer que não importa. Uma delas é o fato de a
historia do filme se passar na Califórnia, quando no livro, a trama acontece na
Pensilvânia. No livro, o fantasma de Roland LeBay é uma presença constante, e
talvez, o principal motivo pelo qual Christine é má. Aqui, a maldade vem “de
nascença”, em um prólogo ambientado em uma fábrica de carros. Segundo a
biografia de King, lançada pela DarkSide, quando os produtores perguntaram ao
autor sobre a origem do Mal em Christine, ele mesmo não soube responder, e deu
a eles carta branca. Quando viu o filme, em dezembro de 1983, King ficou
satisfeito com o resultado.
Ainda sobre a trilha sonora, o filme é repleto de canções dos anos 50,
cada uma, conforme descobri assistindo ao filme várias vezes, tocada conforme a
situação especifica. Por exemplo, quando Arnie e Christine estão sozinhos na
oficina de Darnell, o rádio toca Pledging
My Love, de Johnny Ace; ou então, após uma discussão com Leigh, Christine
provoca uma distração, obrigando seu dono a sair, deixando a namorada sozinha.
Nesse momento, o radio toca We Belong
Together, de Robert e Johnny, enquanto Leigh sufoca com um hambúrguer, uma
clara alusão de que Christine deixa bem claro que ela e Arnie pertencem um ao
outro, e assim por diante. No entanto, a trilha de Carpenter e Howarth também
possui um significado, em especial na cena em que Repperton e seus capangas destroem
Christine na oficina de Darnell. O tema dessa cena chama-se The Rape, e, sinceramente, passa essa
impressão mesmo, não apenas pela musica, mas pela construção de cena: parece
que, de fato, Christine está sendo estuprada.
A produção do filme levou cerca de três semanas, e os realizadores
contaram com cerca de 25 modelos de Plymouth Fury 1958, cada um com uma
determinada função. Eles também utilizaram outros modelos de Plymouth, como o
Plymouth Belvedere e o próprio Fury, que possui uma estrutura parecida.
Atualmente, os modelos já não existem mais. O diretor Carpenter possui um
modelo Belvedere vermelho e branco, que ele usa para fazer turnês pelos Estados
Unidos. O diretor também fez um vídeo musical em homenagem ao filme, um vídeo
bem legal, devo dizer.
Enfim, Christine, O Carro
Assassino é um excelente filme de suspense, com clima de nostalgia. Um dos
melhores filmes de John Carpenter, e uma das melhores adaptações de Stephen
King.
Altamente recomendado.
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