NOTA: 10
Primeiramente, vou deixar uma coisa clara: resenhas
de filmes de outros gêneros são bem-vindas neste site, apesar de seu nome. E hoje,
vou dar um exemplo disso.
Não é novidade que grandes diretores gostam de firmar
parcerias com grandes atores, justamente pela afinidade que ambos desenvolveram
nas produções em que trabalharam juntos. Existem muitos casos no cinema, e a relação
entre o diretor Werner Herzog e o ator Klaus Kinski é uma delas. Dessa parceria,
surgiram cinco filmes, todos considerados grandes obras por críticos e cinéfilos
do mundo todo. FITZCARRALDO (1982) é
um desses filmes, e sem duvida, o melhor filme que ambos fizeram juntos, ao
lado de Nosferatu, o Vampiro da Noite (1979),
reimaginação do Clássico de F.W. Murnau.
Bom, dois motivos me levaram a querer ver esse filme:
o primeiro foi a informação presente na contracapa do livreto lançado pela Versátil
em parceria com a Folha de São Paulo, que diz que foi uma das produções mais
conturbadas de todos os tempos, e que a cena do barco foi realizada sem nenhum
efeito especial; o outro foi um daqueles anúncios que aparecem no YouTube, no
caso o de uma faculdade, ou curso, de cinema, onde aparecem cenas de grandes
filmes; e um deles em questão mostrava o ator Klaus Kinski num barco com um
gramofone diante de uma floresta. Eu já havia visto esse anuncio varias vezes, e
sempre me encantava com ele. Bom, por fim, resolvi colocar o filme para rodar.
E que experiência. Fitzcarraldo é um dos melhores filmes que já vi na minha vida,
mesmo tendo visto somente uma vez. Um filme belíssimo, maravilhosamente rodado,
com cenários deslumbrantes, fotografia inspirada e um elenco afiado.
Mesmo tendo visto somente um – até então – filme do
diretor Herzog, no caso, Nosferatu,
eu já tinha certo conhecimento de sua reputação como cineasta, principalmente
por conta de seu desejo de realizar filmes grandiosos, onde ele tornou-se
conhecido por levar seu elenco às últimas consequências; e, bom, aqui temos um
exemplo. Mais detalhes sobre isso mais adiante.
Mesmo sendo uma produção alemã, o filme com certeza
foi todo rodado na América do Sul, provavelmente no Peru, e o diretor fez um
excelente trabalho com o que dispunha. As tomadas que o diretor faz da selva amazônica
são de tirar o folego. A câmera de Herzog passeia pelas árvores com
naturalidade impressionante, criando tomadas panorâmicas impressionantes,
dignas de tirar foto e emoldurar, e também, dignas de estudo. Herzog faz uso de
muita câmera alta, para mostrar a imensidão da floresta amazônica, além de
mostrar a cidade peruana com os mesmos toques de mestre. Nessas sequências, o
diretor faz uso da câmera normal, com os planos mais simples, mas não menos
grandiosos. O verdadeiro esplendor fica para as sequências que se passam de
fato na floresta. E existem muitas delas, mesmo antes do grande ato. Herzog leva
seu elenco para o interior da floresta, e mostra tudo sem o menor pudor.
As sequencias na cidade peruana também são impressionantes.
Como eu disse, Herzog não faz tanto uso de câmeras altas, mas o que ele mostra,
enche os olhos. É possível ver sua habilidade em capturar imagens belíssimas,
do tipo que dá vontade de fotografar e emoldurar na parede. Não sei exatamente
onde Herzog filmou as sequências na cidade peruana, mas o que ele mostra é
digno de nota e traz uma sensação agradável, de nostalgia, mesmo para quem não viveu
naquela época.
No entanto, o verdadeiro espetáculo fica para as
cenas no interior da selva e dentro do navio. Conforme mencionado, Herzog não poupava
seu elenco e equipe de passar por perrengues, e aqui não fica longe. Ele levou
todos para o interior da selva, o que deve ter obrigado a todos a enfrentar as
dificuldades de se filmar em um local como aquele. Esse foi um dos inúmeros problemas
que a produção enfrentou, sendo talvez o maior deles, trabalhar com três modelos
em escala real do navio. A famosa sequência em que ele é arrastado para o outro
lado do rio foi rodada sem nenhum efeito especial, e, assistindo ao filme, é possível
perceber isso. Realmente é uma sequência de tirar o folego, onde todos os
envolvidos devem ter sofrido muito para chegar ao resultado que Herzog queria. Além
da famosa sequencia, as cenas dentro do barco também não ficam atrás. As tomadas
que Herzog exibe são lindas, e seus ângulos de câmera também são dignos de
nota. Tudo isso acompanhado pela voz de Enrico Caruso.
Como mencionado, o filme enfrentou sérios problemas
de produção. O primeiro ocorreu quando o diretor teve que remover todos da locação
em razão de uma guerra. Depois, o antigo ator principal enfrentou problemas de saúde
e teve de abandonar as filmagens; o musico Mick Jagger, que tinha um papel no
filme, também abandonou o projeto, em razão de uma turnê de sua banda – os Rolling
Stones – o que obrigou Herzog a cortar seu personagem do filme; além disso, o
diretor foi acusado de exploração dos figurantes indígenas, que sofreram
ferimentos e também morreram durante as filmagens; e também ocorreram duas
pequenas quedas de avião, o que resultou em ferimentos e uma causa de paralisia,
e por fim, um membro da equipe foi picado por uma cobra venenosa, o que o levou
a decepar o próprio pé a fim de salvar sua vida. E claro, ocorreram diversas discussões
entre Herzog e Kinski durante as filmagens, o que tornou-se comum entre eles
durante sua parceria.
Outra coisa que merece menção, é o fato de Herzog não
ter pudor em mostrar a realidade da selva, principalmente dos indígenas. Estou falando
de índios sem dentes, velhos, falando seu idioma natural... Tudo no mais
profundo realismo. Além disso, o elenco também não foi poupado. Durante toda a
sequencia do barco, os atores se sujaram de barro e lama, principalmente Kinski,
o que deve ter tornado a experiência ainda mais real e mais conturbada.
O filme teve locações em Manaus, no Brasil, e no Peru,
principalmente em Pongo de Mainique, o istmo entre os rios Urubamba e Camisea,
36 milhas à oeste de um lugar real, o istmo de Fitzcarrald.
Foi lançado em DVD no Brasil pela Versátil Home Vídeo
em edição individual e também na coleção Cine Europeu, parceria da
distribuidora com a Folha de São Paulo. Atualmente, deve estar fora de
catalogo.
Enfim, Fitzcarraldo
é um filme excelente. Uma historia épica de aventura, filmada de maneira
brilhante, com tomadas e ângulos de câmera de tirar o fôlego. Um filme que
mostra até onde o ser humano pode ir para realizar seus sonhos, mesmo que
signifique ultrapassar os próprios limites. A parceira entre o ator Klaus Kinski
e o diretor Werner Herzog rende grandes momentos e cenas memoráveis,
principalmente a sequência do barco. Um dos grandes filmes do cinema europeu. Maravilhoso.
Créditos: Versátil Home Vídeo |
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